quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O Império da Fome

Andando pelas ruas de Bruxelas hoje, vi A publicidade omnipresente do momento: a coleção de outono de H&M. O que vi nos cartazes nos pontos de ônibus foi a cara da fome. Um bilhão de pessoas no mundo sofre de fome porque não tem acesso à comida. Jamais se viu no planeta tanta fartura de alimentos, a miséria diminuiu em 15% nos últimos dez anos, porém os pratos de um bilhão de seres humanos continuam vazios. E os pratos das modelos e manequins também. Para garantirem seu ganha-pão, privam-se de alimentos.

O que se vê nos cartazes da campanha de H&M? Uma jovem à beira da anorexia, uma pessoa mal-nutrida vestida com a coleção de outono. H&M está associando sua imagem à privação de comida. Se eu fosse acionária, não aprovaria uma campanha apoiada na carência alimentar.

As empresas clientes jogam a responsabilidade nas agências de modelos e manequins, que lançam a bola para os estilistas, que acham normal mulheres altas vestindo tamanho 34. Todos são responsáveis. Deixem nossas jovens comer!

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma jovem entre 15 e 18 anos com pouca atividade física deve consumir 2.125Kcalorias por dia. Cláudia Schiffer afirmava comer 800Kcal/dia e suas formas arredondadas faziam fantasmar os homens. A jovem ilustrando os cartazes de H&M está muito aquém ao exibir suas pernas esquálidas.

Acham que estou exagerando? Deem uma olhada na coleção de H&M aqui. Querem saber mais sobre as recomendações nutritivas da OMS? Procure o quadro 4.6 no documento sobre Human Energy Requirements para as jovens e o quadro 4.5 para os jovens (em inglês).

sábado, 18 de setembro de 2010

Resenha

Blacksad Tomo 4
L'Enfer, le silence

Acaba de sair o quarto volume das aventuras de Blacksad, o detetive gato mais intrépido das histórias em quadrinho. Mais uma vez, Juanjo Guarnido e Juan Díaz Canales oferecem uma HQ de qualidade a seus leitores. Blacksad é um polar com personagens animais antropomorfizados vivendo no reverso da medalha americana dos anos cinquenta. Guarnido e Díaz varrem o American Way of Life e expõem os bastidores da sociedade USA no que há de mais podre. Os espanhóis Guarnido, desenhista, e Díaz, roteirista, publicam Blacksad com a editora francesa Dargaud. Em consequência, a HQ sai primeiro em francês e depois em espanhol.

O primeiro tomo, Quelque Part Entre Les Ombres, fala de corrupção e máfia numa New York sem encantos.

O segundo, Artic Nation, trata do racismo. Ao investigar sobre o desaparecimento da jovem café com leite Kaleigh, John Blacksad se vê entre o fogo de grupos à la Ku Klux Klan e do estilo Black Panthers. Ganhou o prestigiado prêmio de Angoulème na categoria Melhor Desenho. Artic Nation ganhou outro prêmio na França, o Virgin no Virgin Megastore des Champs Elysées, além de ter sido nomeado três vezes no Eisner Awards em San Diego, nos Estados Unidos. Prêmios e nominações em 2004.


O terceiro volume, Âme Rouge, pinta um quadro da América maccartista, onde o herói se vê em maus lençóis de lutas ultranacionalistas e corrida nuclear. Ganhou o prêmio de Melhor Série no Festival de Angoulème em 2006.


O quarto tomo mostra uma ensolarada New Orleans, onde velhos segredos vêm à superfície quando Blacksad se vê confiado uma missão: encontrar o brilhante pianista Sebastian Little Hand Fletcher, dependente de heroína. L'Enfer, le silence mostra o sol, as cores vibrantes e a multidão multiracial da célebre New Orleans décadas antes do furacão Katrina. Enquanto o segundo volume transpira conflitos raciais em todas as páginas, o quarto tomo respira o jazz. A música permeia os quadrinhos, cimentando a ambientação em New Orleans e dando ritmo ao desenho. É um prazer sentir os movimentos dos personages, provavelmente herança do passado de Guarnido nos estúdios Disney; é bom mergulhar num história bem escrita. Sente-se o trabalho duro ao elaborar a edição, isto é, a passagem de um personagem a outro, o corte entre as ações, a mudança de perspectiva. O roteiro é bom, todavia não é o melhor da série. Blacksad 4 é uma obra madura em que o conteúdo e a forma se casam quase magistralmente. E como a cada tomo, a paleta de cores muda para criar uma atmosfera diferente. A conclusão que se impõe é: queremos mais!

Ver o site de Dargaud sobre Blacksad.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Belgicanos

15 de setembro de 2010

Os três grandes sindicatos belgas, FGTB (socialista), CSC (cristão) e CGSLB (liberal) organizam uma manifestação hoje às 11h em Bruxelas (rótula de Schuman) para defender a aposentadoria e a pré-aposentadoria, como nos conta Le Soir. A manifestação deve fazer pressão na discussão entre os sindicatos e a federação de empresas belgas (FEB) prevista para 17h. 274 milhões de euros estão em jogo para aposentados, pré-aposentados, incapacitados e desempregados.

La Libre Belgique especula sobre o fim da Bélgica como a conhecemos hoje. A questão que orienta seu artigo principal é: "Em caso de separação, como ficaria a ex-Bélgica em relação às União Européia?". Se por exemplo, a Flândria declarar independência, os "restos" da Bélgica continuariam a ser um país membro e os flamengos necessitariam se candidatar. Se a Bélgica se desmembrar, ambas partes precisariam se candidatar. Se a Flândria se tornar independente e se candidatar a país membro da União Européia (UE), precisaria respeitar o Tratado de Lisboa, inclusive no que diz respeito aos direitos de livre circulação e respeito de minorias étnicas. Em outras palavras, a Flândria teria de fazer enormes concessões sobre o respeito de francófonos na periferia de Bruxelas, isto é, uma política de integração oposta à atual. E teria de criar um Banco Central. Enquanto aguardasse sua entrada na UE, poderia beneficiar de um estatuto de micro-Estado associado como San Marino, Mônaco ou o Vaticano, e manteria o euro enquanto moeda. Caso a Bélgica se desmembrasse, a sede da União estaria fora de um país membro. Se a briga por Bruxelas demorasse, a Comissão, o Parlamento e etc (bota etc nisso) talvez tivessem de fazer as malas e se mudar. Ou fizessem pressão para que uma solução mais curta fosse achada. No momento a política européia consiste em considerar a disputa por Bruxelas uma questão própria à Bélgica. No entanto, conforme comenta La Libre, a separação da Bélgica poderia vir a ser a gota d'água que faz transbordar a União. A gestão de políticas em comum a vinte e sete já é problemática. Aumentar o número de países membros multiplicaria a dificuldade de negociações e poderia até por em risco a existência da UE. Afinal, se a mesma existe para integrar, como criar união onde países se desmembram? E seria a Bélgica o estopim para a independência de outras regiões como a Escócia, ou o País Basco por exemplo? Como seria a convivência dos grandes países europeus como a Alemanha, motor da Europa, com uma miríade de países cada vez menores?


Obs: Retirei o jornal francês Libération da lista de fontes - coluna da direita. Apesar de apreciar muito o mesmo, tanto pelo conteúdo quanto pela forma, botei o Libé para fora. Os artigos são pagos. É verdade que se trata de uma tendência; vários jornais mundo afora preferem deixar uma amostrinha dos artigos e exigem pagamento para ler o resto. Mas, por outro lado, os artigos se tornam menos lidos e menos citados. Pode-se dizer que é um tiro no pé? Talvez. Afinal, no jornalismo como no mundo científico não adianta nada realizar um trabalho fabuloso se ninguém cita.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

360° Europa

10 de setembro de 2010

Na Bélgica, Le Soir põe em evidência a futura pensão do ex-bispo de Bruges, Roger Vangheluwe: 2.800 euros até bater as botas. O bispo deveria se aposentar ano que vem. No entanto, em consequência da mediatização dos abusos sexuais que o ex-bispo cometeu sobre seu sobrinho, Vangheluwe se viu obrigado a demitir-se. Em virtude de sua longa carreira no seio da Igreja, terá direito a pensão completa, conforme anuncia o porta-voz do ministro da Justiça Stefaan De Clerck. No momento, o ex-bispo de Bruges permanece na Abadia de Vleteren Ouest, enquanto aguarda uma posição do Vaticano sobre os escândalos envolvendo-o.

La Libre Belgique prefere a reforma do Estado belga como matéria principal. Primeiro vieram no verão os furacões Bart De Wever (N-VA) e Elio Di Rupo (PS) como préformadores, negociadores ou outros títulos mais - o rei Albert II transborda de imaginação quando indica alguém para negociar reformas estatais; já tivemos direito a reformadores, préformadores, e até a caça-minas, dentre outros. Verdade seja dita, ele tem quatro anos entre cada eleição para encontrar termos novos. Vai uma sugestão: descorticador.
Voltando ao assunto, Di Rupo esteve perto, tão perto chegar a um acordo com os sete partidos à mesa de negociação, os verdes Groen ! e Ecolo, os socialistas SP.A e PS, os cristãos CD&V e CDH, e o nacionalista N-VA... O N-VA bateu o punho na mesa e exigiu a presença dos liberais Open VLD e MR. Di Rupo pediu demissão ao rei, foi tomar um bom banho e dormir. Albert II chamou o presidente da Câmara, André Flahaut (PS) e o do Senado, Danny Pieters (N-VA). E estes haviam trocado figurinhas com seis partidos, tudo parecia andar, até encontrarem Di Rupo, enquanto presidente do PS ontem à tarde. O último contestou o método utilizado por Flahaut e Pieters. O método consiste em uma lista sócio-econômica e uma lista comunitária com dezenas de pontos. Cada presidente de partido deve completar as listas e dar a sua ordem de preferência para cada ponto. Teoricamente, todos os partidos deveriam receber seus formulários até sexta-feira e fariam o dever de casa no final de semana. Segunda, os negociadores teriam os resultados e os compilariam para o relatório ao rei. Todavia, como Di Rupo não aceitou o método, Flahaut e Pieters se veem com o abacaxi nas mãos e devem elaborar outra forma de descascá-lo. Nunca gostei da linha editorial do jornal La Libre Belgique, porém estou revendo minha opinião. A melhor cobertura da reforma do Estado tem sido feita pela Libre. Vai muito mais além do que os outros órgãos da imprensa belga. Sou obrigada a tirar o chapéu. Quem quiser ler a cobertura da Libre de hoje, clicar aqui.

Enquanto isso...

Na França, Le Figaro, Le Monde e Libération enfocam o caso Woerth-Bettencourt. Como sempre, a corrupção dá emprego a um bocado de jornalista, sobretudo num caso como este em que a cada dia revelações são feitas. Hoje há três novas.

Eric Woerth, atual ministro do Trabalho, da Solidariedade e da Função Pública (mas que título pomposo!) teria anulado uma inspeção fiscal do chefe da Sociedade Francesa de Cassinos, Pascal Pessiot. Woerth era na época (2009) ministro das Finanças (ou, para sermos mais exatos, ministro das Finanças, das Contas Públicas e da Reforma do Estado; os franceses não fazem por menos).

A segunda novidade é relativa a Bernard Mardoff. Lembram? Foi aquele 171 que criou uma pirâmide em Wall Street e arruinou diversas fortunas mundo afora. A família Bettencourt teria feito negócios escusos com Madoff através de contas em Luxemburgo. O administrador atual dos bens da família herdeira de L'Oréal, Patrice Demaistre, recebeu uma condecoração da Legião de Honra por recomendação de Eric Woerth.

A terceira bomba é relativa à coleção de arte de François-Marie Banier financiada pelos Bettencourt. O artista fotógrafo-pintor-escritor teve direito a diversos quadros de pintores mais do que renomados num valor de 19,5 milhões de euros.

Os nomes Woerth e Bettencourt têm sido escritos com hífen pela imprensa francesa em razão das diferentes ligações entre o ministro do Trabalho e os herdeiros L'Oréal. A esposa de Woerth arrumou um emprego graças a Patrice Demaistre, administrador dos bens Bettancourt. Este ganhou sua condecoração graças à influência do ministro na Legião de Honra. E, mais importante de tudo, Liliane Bettencourt doou uma fortuna ao partido UMP durante as eleições. Eric Woerth era então o tesoureiro do partido para a campanha do atual presidente Nicolas Sarkozy. A briga de Liliane Bettencourt e sua filha deflagrou uma série de revelações que colocaram o ministro Woerth em situação delicadíssima e o escândalo respingou no presidente Sarkozy.

Woerth também tem seu blog. Clicar aqui. Para conhecer um pouco mais seu percurso, clicar aqui no site do ministério do Trabalho.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

360° Europa

9 de setembro de 2010

A imprensa européia é unânime. Os jornais citam Obama ao afirmar que queimar o Corão não levará a nada, ou melhor, aumentará a fogueira do terrorismo. O pastor Terry Jones, da igreja Dove World Outreach Center, em Gainesville (Florida), chama seu mirrado rebanho de cinquenta fiéis para uma grande queima do livro sagrado muçulmano que ele organiza. Já juntou mais de duzentas cópias. O pastor conseguiu chamar a atenção do mundo para seu delírio. A Igreja Católica, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-Moon, a Secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton e o presidente americano, Barack Obama, todos se manifestaram contra a fogueira do pastor por mensagens ou conferências. Muitas outras personalidades políticas mundo afora também condenaram sua ação. No entanto, o fogoso Jonas pisa firme e mantém seu calendário: sábado 11 de setembro atiçará a fogueira das paixões ao queimar o maior símbolo da fé islamita. Segundo o mesmo, não pretende incitar ao racismo e aceita perfeitamente muçulmanos moderados. Seu objetivo é mandar uma mensagem para o radicalismo no seio do Islã.

Consultei os jornais que se encontram em Fontes (ver coluna à direita). A matéria está na home page de: Le Soir, La Libre Belgique, El Mundo, El País, Le Monde, Le Figaro, Libération, La Reppublica, Corriere della Sera, The Independent, BBC News, Correio da Manhã, enfim praticamente todos os jornais que consulto regularmente. Informações coletadas em vários deles me permitiram escrever o resumo. A única exceção foi o português Diário de Notícias. O britâncio The Guardian demorou, contudo mudou a home page à tarde e publicou um artigo sobre a queima, substituindo outro a respeito de "Como cozinhar o perfeito brownie".

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Pipóle do 7 de setembro

Ontem foi a festa da Independência do Brasil. Caindo numa terça, tornou-se a desculpa ideal para não se trabalhar na segunda. Feriadão de quatro dias no Brasil, beleza. Será que alguém se lembra de 1822, de D. Pedro I (aquele jovem de barba preta pai do velho de barba branca nos manuais escolares)? Pois ontem seguimos os passos de Ibrahim Sued (olha ele aí de novo) e passamos a hora do almoço com as locomotivas brasileiras na Bélgica. E aonde vai o jet-set, aqui chamado em franglês de "people" (leia-se "pipóle")? Vão à residência do embaixador, Avenue de Tervuren, endereço nobre na capital da Europa. A magnífica residência merece ser tratada de mansão e certamente ajuda a criar um ambiente propício a recepções, almoços ou outros encontros onde o social, o político e o comercial se mesclam alegremente. O único porém à recepção foi o tempo que havia encharcado a grama. Os passeios românticos pelo imenso jardim tiveram de se contentar com os caminhos. Para não sujar os calçados lustrosos e os saltos altos na grama molhada, os convidados meio que se espremeram na tenda e no interior da residência. Em meio a bolinhos de bacalhau, pãezinhos de queijos, empadinhas, guaraná, caipirinha, vinho e outras delícias, a multidão se mexia e ondulava embalada pela sonoridade de nossa língua mater, o belo português. Civis e militares, professores, intérpretes, músicos, estudantes, embaixadores, diplomatas, secretárias... provavelmente todas as camadas da população estavam ali representadas, assim como todas as cores de peles, cabelos e olhos. A recepção foi a cara do Brasil: 500 anos de sábia mistura.

E tem mais: o presidente Luís Inácio Lula da Silva publicou uma mensagem para os brasileiros residentes no exterior. Ver no site do Itamaraty.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Belgicanos

6 de setembro de 2010

Hoje, ao invés de comentarmos a imprensa européia, faremos um tour mais curto sobre o Blanc Bleu Belge (tente falar rápido três vezes seguidas), isto é, notícias belgo-belgas sobre a terra dos, como dizia o jornalista e colunista social Ibrahim Sued (estou traindo a minha idade), belgicanos.

Finalmente Elio Di Rupo (PS) pode tomar um bom banho e dormir. As sete semanas de negociações arruinaram sua aparência e desmancharam o criogenizado sorriso de orelha a orelha. No final das contas, as negociações deram com os burros n'água. Di Rupo se demitiu da função de préformador (seja lá o que isso significar) e o rei Albert II aceitou enfim sua demissão. Então ficou combinado assim: nada fica combinado e precisa negociar tudo de novo. O rei retirou seu bispo e agora lança mão de dois peões, o presidente da Câmara, André Flahaut (PS) e o do Senado, Danny Pieters (N-VA). Algumas peças descartadas do tabuleiro pelas urnas, leiam-se os liberais do norte e sul do país (Open VLD e MR respectivamente), querem entrar no jogo. Vamos ver que bicho vai dar...

Os negociadores flamengos lutam duramente para preservar seus interesses na periferia de Bruxelas e o dossiê BHV (leia-se Bruxelas-Hal-Vilvorde) é a prova. E o governo flamengo encomendou um estudo sobre a população das 19 comunas na periferia de Bruxelas e das 6 comunas "de facilidades" (onde todos deveriam viver em paz e harmonia independentemente da sua etnia). Que ducha fria deve ser para os negociadores flamengos mais radicais os resultados do estudo: a periferia está se tornando cada vez menos flamenga. As conclusões do estudo publicadas por Le Soir - mencionado por todos os outros órgãos da imprensa francófona - mostram no dia seguinte ao Gordel (passeio de 100Km de bicicleta pela periferia de Bruxelas com objetivo político de reafirmar o caráter flamengo da dita periferia) que a proporção de flamengos cai vertiginosamente nos últimos anos. O fenômeno é devido à migração de bruxelenses cuja língua materna não é o holandês para a periferia. Até 2060, BHV deve aumentar sua população em 28%, Bruxelas em 29% (exporta bruxelenses, porém continua crescendo) e a Flândria em 15%. Jovens casais com crianças pequenas falando holandês em casa representam 14% da população nas comunas de facilidades, 40% na periferia e 79% na Flândria. A tendência nas próximas décadas é de haver cada vez menos flamengos nos arredores de Bruxelas. Ora, a identidade flamenga da periferia é um principais argumentos dos negociadores do norte do país. Mas como justificar o combate dos mesmos se eles representam uma parcela da população cada vez menor justamente na área que concentra todas as atenções e disputas?

A quem interessar possa, comuna é uma cidade de segunda divisão, uma espécie de município que não possui o estatuto de cidade. Há 589 comunas na Bélgica e 87 cidades. Maiores explicações no Wikipedia ou no site do governo belga, belgium.be.

A quem interessar possa também, segundo o Houaiss, o habitante da Flândria pode ser chamado de flamengo, flandrense, flandrino, ou flandrisco.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

360° Europa

1 de setembro de 2010


Le Soir nos conta que o cardeal Godfried Danneels se considera difamado pelo jornal De Standaard. Segundo o periódico flamengo, o cardeal teria posto panos quentes no caso de abuso sexual do bispo de Bruges, Roger Vangheluwe, sobre seu sobrinho. A par do ato de pedofilia, Danneels, antigo arcebispo de Mechelen-Bruxelas e representante de Roma na Bélgica, teria abafado tudo. A vítima gravou a conversa que teve com seu algoz e o cardeal Danneels dia 8 de abril. A gravação foi publicada por De Standaard. Nesta, o cardeal tenta convencer a vítima a se contentar com um pedido de perdão e pede que a história não se torne pública antes da aposentadoria do bispo de Bruges um ano depois. Como sabemos todos, o caso veio a público e o bispo de Bruges pediu demissão em 23 de abril ao reconhecer ter abusado de seu sobrinho por mais de dez anos. O cardeal Danneels repudia a publicação pelo De Standaard, dizendo-a manipuladora, criando uma imagem negativa do eclesiástico. Até poucos anos atrás, o cardeal era considerado um forte candidato ao papado. Não precisa de bola de cristal para adivinhar que o cardeal Danneels perdeu suas chances.

A volta às aulas estão na página web de La Libre Belgique, assim como as negociações para a reforma do Estado belga. O grande vencedor das eleições na Flândria, a N-VA, sai da mesa. Desde as eleições de junho, Bart De Wever tomou as rédeas das negociações, passando-as depois para o PS, vencedor na Valônia, isto é, Elio Di Rupo. Os negociadores estavam muito próximos de um acordo, porém no momento estão à beira do precipício. Segundo os francófonos, os flamengos CD&V e N-VA bloqueiam as negociações, já os mesmos dizem que são os francófonos que bloqueiam tudo. A N-VA quer incluir os partidos liberais do Norte e do Sul do país nas negociações e, segundo La Libre, alguns francófonos acariciam a idéia de negociar sem a N-VA. Difícil conciliar os socialistas e os liberais no poder, dois bicudos não se beijam. No entanto, mais espinhoso ainda está sendo encontrar interesses em comum entre o CD&V e a N-VA de um lado e os outros partidos à mesa das negociações de outro. Como sempre, caberá ao rei desenrolar o novelo de lã. E aparentemente será para muito em breve.

El Mundo e El País comentam a declaração do presidente americano, Barack Obama, sobre a retirada das tropas americanas do Iraque. Os dois jornais aproveitam as possibilidades tecnológicas da Internet para integrar no site o vídeo da declaração de Obama (traduzido em espanhol). Conforme contam os jornais espanhóis, Washington começa a retirada das tropas agora. 50.000 soldados devem partir do Iraque até dezembro de 2011 após sete anos e meio de presença americana. No auge da afluência, 165.000 se encontravam em solo iraquiano. Estima-se que um milhão de soldados americanos passaram pelo Iraque durante a Guerra do Golfo II. No total, 4.247 morreram e 34.268 foram feridos. Segundo o governo dos EUA (EE UU em espanhol), está no hora voltar para casa. O ponto de vista do governo iraquiano não foi comentado pelos periódicos espanhóis. No entanto, como já foi citado neste blog, o ministro da Defesa iraquiano, general Babaker Zeba, afirma ser cedo demais para deixar o Iraque e diz ser impossível reestruturar o exército de seu país antes de 2020. Ver postagem aqui 

Do outro lado do Canal da Mancha, The Guardian e The Independent também põem em evidência o mesmo assunto: o catch-wrestling entre Tony Blair e Gordon Brown. A autobiografia de 700 páginas do antigo primeiro-ministro Tony Blair estão sendo publicadas hoje. Seu desafeto, o também ex-primeiro-ministro e também líder do partido trabalhista Labour, Gordon Brown, teve direito a comentários picantes de Blair na autobiografia. Segundo Blair, Brown na liderança do país era um desastre previsível; seria dotado de uma inteligência emocional zero; sua perda nas eleições de 2010 para o conservador David Cameron era inevitável. Mas Brown não foi o único assunto, afinal encher linguiça de 700 páginas demanda muito mais. O Iraque é outro ponto forte nas entrevistas que Blair deu sobre o livro. O ex-primeiro-ministro se diz angustiado com as consequências, imprevisíveis segundo o mesmo, da participação britânica na guerra do Iraque. Seria um longo pesadelo que foi muito além do que ele poderia conceber. Nem a Grã-Bretanha nem os Estados Unidos haviam antecipado o papel da Al-Qaeda na guerra. Deixar Saddam Hussem no poder seria um risco maior do que retirá-lo. O que não é comentado pelos jornais britânicos é como Blair conseguiu arrumar tempo para escrever 700 páginas sem ajuda. A aposentadoria do ex-primeiro-ministro foi-lhe altamente profitável. Ao sair do 10 Downing Street, Blair foi imediatamente enviado ao Oriente Médio como emissário do Quarteto União Européia-ONU-Estados Unidos-Rússia. Desde então, 2007, fez fortuna trabalhando como consultante e dando conferências. Segundo Rue89, Blair abocanhou 17 milhões de euros em três anos com a autobiografia, consultoria, conferência, aposentadoria de ex-primeiro-ministro, etc.